Me conheça, seu dotô!
O processador de textos Fácil - daí surgiu o nome da empresa Fácil - <https://facil.com.br/> - foi um sucesso de vendas no Brasil no final da década de 80 e início da década de 90.
O Fácil tinha usuários apaixonados em todo o Brasil. O poema abaixo, Me conheça, seu dotô!, foi escrito por Júlio Torres (1) em 19 de fevereiro de 1995. Torres era um desses usuários que utilizava, indicava e contribuia com sugestões.
A história do lançamento do Fácil editor de textos, até seu desaparecimento, está no livro O analista de Blumenau (2).
A idealização inicial, a visão de que um processador de textos adaptado à lingua portuguesa poderia fazer sucesso no Brasil, concorrendo com os produtos americanos difundidos na época, principalmente o Wordstar, foi minha. Além disso minhas contribuições foram o nome Fácil e todo o desenvolmento da estratégia de marketing, criação de uma rede de revendedores, apresentações em todo o Brasil e administração do dia a dia da empresa.
Mas o Fácil não teria o sucesso que teve, sem a participação de um técnico brilhante, encarregado da programação dele.
A programação do Fácil ficou a cargo de um profissional com uma mente brilhante, que podia transformar algoritmos em verdadeiras pérolas. O meu amigo, José Milton da Silva (3), abraçou a causa e focou na construção de um dos melhores programas já feitos no Brasil. Sozinho conseguiu escrever, em Pascal, um dos programas mais difíceis de se programar.
O Fácil, lançado na versão DOS em 1987, ganhou também uma versão Windows em 1993. O Editor de Textos Fácil foi o primeiro produto brasileiro desenvolvido em Windows a ser vendido em larga escala em todo o território nacional.
No lançamento do Fácil para Windows em 1993 na Fenasoft, ganhamos o prêmio máximo da feira, o Max Award. Na foto aparecem o jornalista Stephen Banker, da Revista Byte U.S.A (centro), José Milton da Silva (esq) e Carlos José Pereira (dir).
Nas andaças pelo Brasil fazíamos amizade com profissionais de diversas empresas, principalmente da área de informática, alguns destacados, como o cearense, Júlio Torres.
Torres, professor universitário, usuário do Editor de Fácil para DOS, apaixonado pelo produto, escreveu em 1995 este poema singular, "[...] em português espontâneo, rústico, rude, porém expressivo." (4)
ME CONHEÇA, SEU DOTÔ!
Júlio Tôrres — 19.02.1995
Agora você, dotô, Vai vê o qui é qui sô E o qui posso fazê... Sô Fácil inté no nome E ajudo todo home Na arte de escrevê.
Eu sô um Processadô De Texto. Em computadô Ajeito quarqué escrita. Você num se aperreia, Se sua escrita fô feia, Cumigo fica bunita.
De briga feia num corro, Por isso mermo concorro Cum softes do estrangêro, E garanto qui eu sô O mió Processadô Prá língua dos brasilêro.
Eu pôpo seu sacrifíço... Se você achá difíço Argum verbo conjugá, Eu conjugo prá você, Dispôis é só escolhê E pô em quarqué lugá.
Se por acaso você, Na hora de escrevê, Num subé acentuá, Dêxe ôtra vez cumigo, Qui o acento eu consigo Butá, certim, no lugá.
Você digita direto, Eu garanto qui, correto, Sílabas vou separá. Chegando no fim da linha, A tarefa é toda minha, Num vá se preocupá.
Quando as palavra separo, Bem direitim eu reparo Se é cum hífe ou travessão. Ponho no texto moldura, Insiro arquivo e figura, E faço tabulação.
Você pode usá tabela Ou diálogo em janela, Prá seus dado digitá. Se você tivé priguiça De escrevê frase intiriça, Você pode abreviá.
Gerencio todos arquivo, Faço índice remissivo, Boto valor por extenso, Modelo os documento, Faço os alinhamento, Pro texto não ficá penso.
As divisão eu formato, Os parágrafo eu trato, Faço sumário também. Cabeçalho, rodapé, Trabaio usando OLE, Eu faço como ninguém.
Se na hora de escrevê Você num subé dizê O CEP da rua qui mora, Fechô o ôlho e abriu, Quarqué CEP do Brasil Trago prá você na hora.
Dispôis de tudo escrevê, Você pode inté querê Todo o texto revisá. Reviso inté em Ingrês, E também em Português Do Brasí e Portugá.
Toda dúvida possíve, Tem ajuda disponíve, Enquanto você trabaia. Usando teclas de ataio, Eu mioro seu trabaio, O mouse não lhe atrapaia.
Num dixe nem a metade Das minha facilidade Qui tenho prá lhe ajudá. Sô Fácil sofisticado, Dêxo prá trás um bucado Dos Processadô qui há.
Lhe peço, então, meu dotô, Me explore, por favô, Garanto qui vai gostá... Dispôis de duas ou três hora, Vai jogá os ôtro fora, Nunca mais vai me largá.
(1) "O Professor Júlio Torres é um estudioso e pesquisador da Teoria da Complexidade (Fractais, Caos, Catástrofes e Lógica Fuzzy) aplicada às Organizações, à Estratégia, à Gestão, à Educação e à Experiência de Ócio; foi Professor da UNIFOR – Universidade de Fortaleza, durante 21 anos, onde ministrou a Disciplina Administração, Empreendedorismo e Inovação, na Graduação, e a Disciplina Teoria da Complexidade, na Pós-Graduação; foi Professor do Departamento de Computação da UFC – Universidade Federal do Ceará durante 35 anos, ao mesmo tempo em que foi funcionário do Banco do Nordeste, durante 20 anos, onde, entre outras funções, foi consultor e instrutor de Desenvolvimento de Equipe e Estratégia Corporativa." Disponível em: https://teoriadacomplexidade.com.br/. Acesso em: out. 2022.
(2) PEREIRA, Carlos José. O analista de Blumenau. 1 ed. Blumenau: Nova Letra, 2012.
(3) O José Milton da Silva deixou a Fácil em 2001, vendendo suas cotas para mim, e passou a se dedicar exclusivamente a outra empresas que havíamos criado em 1998 com outros sócios. Eu vendi minha participação nessa nova empresa e passei a me dedicar principalmente à Fácil desde então.
(4) FREYRE, Gilberto. Nota prévia; In: LOPES, José de Ribamar. Literatura de cordel; antologia. Organizador: José de Ribamar Lopes. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 1994, p. XIX.